AS MINHAS CRUZES ESTÃO VAZIAS PORQUE:
O Cristo da minha cruz foi cuidar de quem cuida, vestiu a bata e anda nos hospitais do mundo inteiro a segurar a vida que tem andado suspensa nos beirais da História.
O Cristo da minha cruz foi suster o ânimo dos que criam as vacinas, os medicamentos, um meio seguro de nos salvar a todos.
O Cristo da minha cruz vai dentro das ambulâncias que correm pelas cidades
desertas, em lutas contra o tempo e contra a morte e foi percorrer o mundo
inteiro, evitando os desesperos de quem não sabe como vai ser a vida a seguir.
O Cristo da minha cruz foi abraçar os braços vazios de abraços, foi dar a
mão a quem morre sozinho, foi limpar as lágrimas dos que não podem dizer adeus
a quem amam. E anda nas ruas vazias, a recolher o lixo, a desinfetar as praças,
a limpar o medo e a acompanhar a solidão que espreita as esquinas.
A minha cruz está vazia. E eu sei (sabemos todos) que esta Semana Santa
será Maior do que tantas Semanas Santas das nossa vidas: Cristo lavará os pés a
todos os que, exaustos, não desistem de lutar pela vida e beijá-los-á,
certamente, porque são esses os pés que, nos nossos dias, anunciam a esperança
e fará com eles a Ceia da Quinta-Feira; estará à beira dos que sofrem e morrem,
ajudando-os a percorrer o caminho que une o chão ao Infinito e consolando os
que, à beira das cruzes que se erguem no mundo inteiro, têm o coração em
frangalhos.
O Cristo da minha cruz vazia está vivo. É o rosto cansado dos que não veem
os filhos há muitos dias, porque têm de os proteger. Está nas mãos dos que
enfrentam o medo (todos têm medo) para ajudar quem precisa. Enxuga as lágrimas
dos que estão sós. Está nos que têm de tomar decisões. Está nos que nos mantêm
informados e nos dão esperança.
O Cristo da minha cruz vazia semeou esperança no meio do povo. E não o
deixa cair na tentação de desanimar, apesar de todos os cansaços, apesar de
tudo.
Tenho a cruz à porta. Vazia.
O Cristo da minha cruz, mudou-se para dentro de cada um.
Abril 2020
Lídia Ramalho
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